Da Rede Brasil Atual - A chamada Super Terça mostrou que o ex-vice-presidente de Barack Obama, Joe Biden, “ressuscitou” na disputa pela nomeação do candidato democrata que disputará as eleições presidenciais de outubro contra o republicano Donald Trump. Biden conta com maior simpatia da máquina do partido e seus setores mais conservadores, enquanto Sanders é dono de uma plataforma mais à esquerda, não só em relação à média do próprio partido, mas do eleitorado dos Estados Unidos como um todo, o que apavora o establishment democrata.
Biden poderia estar consolidando um favoritismo natural no Partido Democrata? “Não, acho que ele não se consolida, mas que desponta como favorito. Biden conseguiu fazer uma coisa impressionante na terça-feira. Conseguiu votos desde o norte do país, desde o Maine, até o sul, pegando dez estados seguidos”, avalia Thomas Heye, professor do Instituto de Estudos Estratégicos da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Mas se o vice de Obama – até recentemente desacreditado entre seus próprios pares – teve desempenho melhor do que se esperava, ou se Sanders com seu “socialismo” pode virar o jogo entre os democratas, para grande parte do eleitorado norte-americano há uma questão mais importante: qual é o candidato com mais chances de bater Trump?
Na opinião de Heye, tanto Biden como Sanders podem chegar à Casa Branca. Nesta quinta-feira (5), a contagem de delegados já conquistados mostrava 671 a 589 a favor de Biden. Na próxima terça-feira (10), os democratas realizam primárias em Dakota do Norte, Idaho, Michigan, Mississippi, Missouri e Washington. “O alvo principal é Michigan, com 125 delegados. Caso Sanders vença, fortalece em muito a sua candidatura. Todavia, se Biden vencer, Sanders fica em posição difícil de reverter”, na opinião de Heye. A senadora Elizabeth Warren anunciou que decidiu abandonar a disputa.
O atual morador da icônica White House tem a seu favor o desempenho da economia norte-americana, particularmente na questão do emprego. Em outubro, o presidente comemorou dados sobre a taxa de desemprego, que caiu para 3,5% em setembro, o menor índice em 50 anos e próximo ao pleno emprego. Em janeiro de 2020, a taxa foi de 3,6%.
“Para os eleitores de Trump, justifica-se ele permanecer. Para os eleitores democratas, obviamente, não”, observa o professor da UFF. Ele lembra que, na eleição do atual presidente, em 2016, se dependesse do eleitorado feminino, o atual presidente teria sido derrotado.
Hillary Clinton conseguiu 54% dos votos das mulheres, contra 42% do republicano. A tendência do voto de protesto feminino é crescer em 2020. “O eleitorado feminino pode comparecer em números maiores agora. Quem ficou contrariado com as bobagens que Trump disse e fez – e fez bastante – está mais motivado a registrar seu protesto, porque
Trump é uma ameaça.” Nos EUA, o voto não é obrigatório.
O presidente dos Estados Unidos coleciona agressões contra afroamericanos e mulheres. Em julho do ano passado, a chanceler alemã, Angela Merkel, chegou a se manifestar contra tuítes racistas de Trump com agressões a mulheres congressistas norte-americanas de origem estrangeira.
Além das mulheres, os democratas contam com o eleitorado negro. Neste segmento, Biden leva vantagem sobre Sanders. Heye nota que o eleitorado negro americano é mais conservador do que se pensa. Além disso, Biden tem a imagem de ter sido o vice do primeiro presidente negro dos Estados Unidos, o que não é pouco.
“Talvez parte do eleitorado negro veja nele um candidato confiável”, diz Heye. Na Carolina do Sul, por exemplo, no final de fevereiro, Biden teve aproximadamente 60% dos votos de eleitores negros.
Uma questão pouco comentada, mas que historicamente tem muito peso entre os eleitores americanos, é o chamado “carisma” dos candidatos. Nesse quesito, Biden perderia de longe, já que seu aspecto é o de um homem de cera. “Claro que esse fenômeno existe, mas acho que, depois que elegeram Bush filho (George W. Bush), completamente desprovido de carisma, isso mudou. Por outro lado, Trump não faz comício, faz show”, observa.
Na opinião do professor da UFF, uma eventual derrota de Donald Trump “indicaria profunda mudança, positiva, no mundo: teríamos um novo tabuleiro, e o Brasil, em particular, teria que reinventar uma política externa, que no momento não temos, já que a atual política é simplesmente se atrelar aos Estados Unidos”.
Seja como for, o cenário é incerto e, se Biden parece despontar como favorito após a Super Terça, pesquisa Reuters/Ipsos realizada entre 17 e 25 de fevereiro, divulgada pelo portal Uol, mostra que cerca de 26% dos democratas e independentes entrevistados afirmaram acreditar que Sanders tem mais chances contra Trump.
Biden (17%) vem apenas em terceiro lugar na pesquisa, atrás do bilionário Michael Bloomberg, com 20%. Mas esse cenário já deve estar mudando, após a ascensão de Biden.