O livro Roça sem fogo: da tradição das queimadas para a agricultura sustentável na Amazônia – a mais nova produção editorial da Embrapa Amazônia Oriental (Belém, PA) – reúne artigos sobre um processo tecnológico que substitui o uso do fogo para fins agrícolas e, por extensão, diminui o risco de incêndios florestais decorrentes de queimas feitas sem os devidos controle e acompanhamento.
O uso do fogo na agricultura é uma tradição milenar na Amazônia, originada nos tempos pré-colombianos, com os antepassados dos atuais indígenas. Na atualidade essa prática não é mais sustentável, embora ainda seja utilizada como opção barata e rápida de limpeza e preparo do solo antes do plantio.
“Reproduzida sem a escala e os cuidados dos indígenas que dominavam o seu uso, a queimada se tornou um problema ambiental, inclusive uma das causas do aquecimento global”, afirma o engenheiro-agrônomo Raimundo Nonato Brabo Alves, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), editor técnico e um dos seis autores da coletânea recém-lançada.
O pesquisador conta que o vácuo tecnológico entre a agricultura moderna e a agricultura de derruba (corte) e queima na Amazônia trouxe um grande desafio à comunidade científica e aos produtores: encontrar um modo sustentável de substituir as queimadas.
“As pesquisas e estudos dos processos de transição para agricultura sem queima na Amazônia continuam, mas a Embrapa, como grande geradora de tecnologias para reduzir o uso do fogo na agricultura brasileira, já disponibilizou à sociedade várias tecnologias desenvolvidas com esse intuito”, salientam os autores da obra. Do livro constam artigos já publicados, mas há capítulos inéditos, como o que trata da trajetória da civilização do fogo na Amazônia. O conteúdo pode ser acessado gratuitamente no Portal Embrapa, neste endereço eletrônico:http://ainfo.cnptia.embrapa.br/digital/bitstream/item/209906/1/Livro-Roca-sem-fogo.pdf
Roça sem Fogo
Uma das alternativas às queimadas desenvolvida com sucesso por pesquisadores da Embrapa em estreita parceria com os produtores é a Roça sem Fogo, que dispensa o uso de máquinas agrícolas. De fácil adoção, aplicável a culturas anuais e perenes, esse método de preparo de área registra diversos ganhos nas esferas social, econômica e ambiental quando comparado a práticas que se utilizam do fogo em alguma etapa do processo de cultivo.
A relação custo-benefício positiva que resulta da adoção da Roça sem Fogo foi testada e validada por meio de experimentos científicos instalados e acompanhados nos municípios paraenses de Moju (onde a tecnologia foi gerada), Acará, Abaetetuba, Baião, Cametá, Vigia, Mãe do Rio, Tomé-açu, Ourém e Irituia.
A metodologia tem inúmeras vantagens em relação ao sistema tradicional, conforme demonstram os indicadores de rendimento e financeiro publicados no livro. Bem diferente do que ocorre na agricultura com queima, o conjunto de benefícios da Roça sem Fogo permite o aumento da produtividade das culturas e torna viável que uma mesma área seja cultivada por mais tempo.
“No sistema tradicional, o constante uso do fogo, em médio prazo, diminui a fertilidade do solo a níveis críticos, situação que compromete a capacidade produtiva da terra e custa caro ao pequeno produtor rural, pois será preciso providenciar a correção imediata do solo”, explana o engenheiro-agrônomo Moisés Modesto, analista da Embrapa, também editor técnico e coautor da coletânea.
De acordo com Modesto, Roça sem Fogo é uma tecnologia que favorece especialmente os agricultores familiares, pois dispensa o uso de máquinas agrícolas e pode ser aplicada apenas com ferramentas manuais, como a foice, o machado, o facão e a motosserra.
Os autores do livro destacam outras vantagens, como a manutenção da fertilidade do solo (possível porque a matéria orgânica é mantida na terra por meio de cultivos em diversos arranjos espaciais, inclusive com a introdução de plantas acumuladoras de biomassa); a possibilidade de aproveitamento do material lenhoso para a produção de energia; e a menor ocorrência de plantas daninhas em comparação ao sistema de derruba e queima.
Políticas públicas
Moisés Modesto adverte que, por si só, a existência de um processo tecnológico como o Roça sem Fogo, já validado, com custo-benefício positivo, não basta para quebrar o paradigma do fogo na agricultura.
Os autores têm a expectativa de que o livro desperte a atenção do poder público para que a tecnologia da Roça sem Fogo possa se transformar em incentivo à agricultura sem queima na Amazônia, reduzindo, assim, as consequências e implicações negativas constatadas na agricultura de derruba e queima arraigada na região.
“A Roça sem Fogo é uma prática de desenvolvimento sustentável, uma tecnologia ambientalmente ajustada, economicamente viável e socialmente justa. Precisamos que chegue amplamente ao campo, como um marco de mudança de paradigma de uso da terra na Amazônia, incentivada por políticas públicas e mecanismos que facilitem sua difusão e a capacitação intensiva de estudantes, técnicos e agricultores”, finaliza Moisés.
Outros quatro engenheiros-agrônomos da Embrapa Amazônia Oriental são coautores do livro: Alfredo Kingo Oyama Homma, Antônio José Elias Amorim de Menezes, José Edmar Urano de Carvalho e Otávio Manoel Nunes Lopes, este já aposentado.
Além dos produtores, foram parceiros dessa pesquisa da Embrapa o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater) e secretarias de agricultura de todos os municípios envolvidos no projeto.
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Fonte: Embrapa