Historicamente relegada a segundo plano no país, a educação é o setor mais atingido pelos cortes orçamentários do governo de Jair Bolsonaro (PSL). A pasta perdeu R$ 5,84 bilhões, que corresponde a 18,81% dos R$ 31 bilhões cortados até agora de 28 áreas, conforme um estudo do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) divulgado na terça-feira (16). Os pesquisadores levaram em conta dados extraídos no dia 12 de junho no portal do orçamento federal do Senado, o Siga Brasil.
O congelamento atinge em cheio ações do Ministério da Educação (MEC) voltadas à redução das desigualdades educacionais, como a concessão de bolsa-permanência no ensino superior e o apoio à infraestrutura no Ensino Básico. Ambas tiveram corte de 100%.
A medida prejudica especialmente indígenas, quilombolas e estudantes de baixa renda. Alunos cotistas, oriundos de escola pública, ou aqueles que ingressaram em universidade federal devido ao bom desempenho no Enem. É o caso de Silvyo Vinicius Rocha Vieira, 20 anos, aluno do bacharelado em Ciência e Tecnologia da Universidade Federal do ABC (UFABC). Para morar em Santo André, onde estuda, ele conta com o benefício da bolsa. Recebe auxílio de R$ 300 para moradia e outros R$ 400, para outras despesas, além de créditos para almoçar no restaurante universitário.
“Antes do auxílio eu dependia totalmente da minha mãe, que é auxiliar de secretaria em uma escola no interior da Bahia. Ficava bem pesado para ela”, conta Vinicius, que desde 2017 perdeu contato com o pai”
O programa criado em 2003 chegou a ter o orçamento zerado. Como destacam os pesquisadores do Inesc no relatório, porém, houve pressão e esforço no Congresso de se fazer emenda do relator e de comissão para garantir a permanência de indígenas, quilombolas e estudantes de baixa renda nas universidades. “Como este é um gasto necessário todos os meses, na prática estas bolsas não atenderão ao seu público. O próprio portal do MEC diz que o programa foi instituído para minimizar as desigualdades sociais, étnico-raciais e contribuir com a permanência e diplomação de estudantes em situação de vulnerabilidade socioeconômica. O fato de não se destinar recursos para a ação é um sinal de que as desigualdades vão se ampliar e isso não é preocupação dessa gestão.”
Sem infraestrutura
Se depender de Bolsonaro, as escolas que ainda não têm quadra, biblioteca, laboratório e internet, entre outros recursos para melhorar as condições de aprendizado dos alunos, especialmente daqueles de localidades mais pobres, vão continuar na mesma situação.
O apoio à infraestrutura da Educação Básica, direcionada para melhoria e adequação das escolas é outra ação que teve 100% do orçamento congelado.
Segundo dados do Censo Escolar 2018 do MEC, apenas 42% das escolas de ensino fundamental tem quadra, 68% tem pátio e 11% laboratórios de ciências. Sem contar que 5% de todas as escolas públicas do país ainda não tem banheiro. A situação não é muito diferente nas escolas de ensino médio.
A execução orçamentária da educação vem caindo a cada ano. Entre 2014 e 2018, a queda foi de 13,5%. No primeiro semestre de 2019, o contingenciamento retirou 5% do orçamento que havia sido autorizado inicialmente. Segundo o Inesc, com as atuais prioridades do governo e o Teto de Gastosvigente, poucos serão os recursos para a garantia de direitos das minorias brasileiras. “Quando da aprovação da Emenda 95, conhecida como Teto dos Gastos, houve a promessa de que os setores de Saúde e de Educação não seriam afetados. Mas não é o que os números dizem no caso do MEC”, destacam os autores do estudo no relatório.
Exclusão
Ainda segundo o relatório, ações voltadas a exames de avaliação da Educação Básica, de Jovens e Adultos e profissionais, também tiveram orçamento zerado. Esses exames certificam para a continuidade nos estudos. São voltados para estudantes que tiveram de abandonar a escola para trabalhar, por exemplo, e conseguem voltar tempo depois. “Ao cortar recursos da EJA, que é a parte mais fragilizada da educação, é vulnerabilizar ainda mais os vulneráveis, pois sem conclusão da educação básica, a maioria entra para as estatísticas do desemprego. Ou seja, nem aquilo que o governo diz priorizar está isento de cortes, como educação profissional, por exemplo.”,