A visita oficial do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao Chile provocou três dias de protestos. As primeiras manifestações aconteceram na sexta-feira (22), em um local conhecido como Paseo Bulnes – palco de mobilizações históricas na capital Santiago. Os atos políticos em repúdio à presença do político brasileiro terminam no domingo (24), às 15h, com o ato Por el Derecho a Vivir en Paz (Pelo Direito a Viver em Paz). O principal motivo da indignação da população local são as declarações elogiosas de Bolsonaro e sua equipe sobre o ditador Augusto Pinochet, que comandou o país de 1973 a 1990 e foi responsável pelo assassinato de cerca de 40 mil opositores.
Esta semana, o partido Frente Amplio, por meio de uma ação promovida pelas deputadas Claudia Mix e Camila Rojas, entrou com um pedido no parlamento para que Bolsonaro fosse declarado persona non grata no Chile. A hashtag #PersonaNonGrata esteve entre as mais compartilhadas pelos usuários chilenos da rede social Twitter na sexta e no sábado.
O termo persona non grata, com origem no latim, é usado para dizer que uma pessoa não é bem-vinda em determinado local. Conforme a Convenção de Viena, de 1961, se um enviado estrangeiro for taxado dessa forma pelo governo local, deve receber um prazo "razoável" para deixar o país.
Em comunicado oficial, o Frente Amplio explicou que "Bolsonaro não só tem feito apologia à tortura, por meio de seus discursos de ódio, incitando a violência e a discriminação, como busca um retrocesso de décadas de conquistas sociais. As medidas promovidas por seu governo atingem diretamente milhares de mulheres, a comunidade LGTBIQ, os idosos e as comunidades de povos originários".
O partido afirma ainda que "a política exterior de Jair Bolsonaro rompe com décadas de tentativas de cooperação e integração latino-americana, que vão de políticas comerciais até acordos de desmilitarização". Uma das razões que levou o presidente brasileiro a Santiago foi justamente a oficialização de um novo bloco econômico no continente: o Prosul seria uma alternativa a União das Nações Sul-Americanas (Unasul) e reuniria apenas governos de países alinhados aos Estados Unidos.
O presidente chileno Sebastián Piñera é aliado de Bolsonaro e não atendeu aos pedidos da população para declarar o brasileiro persona non grata no país.
Protestos
A manifestação deste sábado (23) foi convocada pelo Movimiento de Integración y Liberación Homosexual (Movilh), em frente ao Palácio de La Moneda, sede presidencial chilena, onde Bolsonaro foi recebido por Piñera para um encontro bilateral.
Na convocatória para o protesto, o Movilh chamou “todos os grupos de direitos humanos do país, especialmente as organizações de pessoas discriminadas, a manifestarem seu máximo repúdio pela visita do presidente do Brasil, Jair Bolsonaro".
O porta-voz da organização, Óscar Rementería, declarou neste sábado: “Estamos aqui para dizer que os discursos brutais de Bolsonaro contra mulheres, imigrantes, pessoas de raça negra, lésbicas, gays, bi e trans são incitação ao ódio e à violência, e devem ser combatidas com mobilizações cidadãs em todos os países visitados pela máxima autoridade do Brasil".
Organizações sociais e feministas reuniram centenas de pessoas no Paseo Bulnes para rejeitar a proposta de criação do Prosul e manifestar repúdio à figura de Jair Bolsonaro. A manifestação contou com a participação das torcidas dos dois maiores clubes do país, os rivais Colo Colo e Universidad de Chile.
Na sexta-feira (22), a deputada do Partido Humanista Pamela Jiles, que se recusou a participar de um almoço com Bolsonaro, afirmou: "O presidente Piñera teve uma dificuldade enorme em se desfazer de sua imagem de 'pinochetista' [defensor da ditadura de Augusto Pinochet], e vem agora desperdiçar esse esforço recebendo um personagem desprezível como Bolsonaro, que francamente é uma vergonha".
Quando era deputado federal em 2015, Bolsonaro disse que "Pinochet fez o que tinha que ser feito". Na quinta (21), em entrevista à Rádio Gaúcha, o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, lembrou que para aprovar mudanças econômicas, entre elas uma reforma da Previdência, o regime militar chileno teve que promover “um banho de sangue”.
A declaração mais recente foi feita em um contexto de rechaço popular à Proposta de Emenda Constitucional nº 6/2019, chamada pelo governo brasileiro de "Nova Previdência", que dificulta o acesso dos trabalhadores e trabalhadoras à Previdência Social.